O Estado de Israel dispõe de quase 100 bombas nucleares, confirma o Instituto sueco SIPRI. No entanto, o governo de Telavive recusa-se a admitir essa realidade, praticando a chamada “ambiguidade nuclear”. Nem a ONU nem a AIEA querem tomar conhecimento do facto, enquanto contribuem para políticas punitivas contra Iraque, Síria e Irão por programas de extermínio massivo que, comprovadamente, não existem.

 

Vista das instalações nucleares de Dimona, em Israel

 

Israel tem um arsenal com quase uma centena de ogivas nucleares, mais do que se previa, de acordo com o Instituto Internacional de Estocolmo para Estudos sobre a Paz (SIPRI na sigla anglo-saxónica). O Estado hebraico recusa-se a admitir que tem armas nucleares, mas este relatório de uma instituição independente agora divulgado vem confirmar uma realidade que só é novidade pela sua imprevista dimensão.

Numa época em que se ameaçam e iniciam guerras acusando nações de trabalhar em armas de extermínio massivo, o facto de Israel possuir armas nucleares sem o mínimo reparo da chamada “comunidade internacional”, sem a menor investigação da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), revela a dualidade de critérios e as cumplicidades criminosas que existem na arena mundial.

O Iraque foi destruído e continua a viver em clima de guerra devido a supostas “provas”, que vieram a revelar-se falsas, de que possuía armas de destruição massiva; a Síria sofre bombardeamentos de potências da NATO devido a supostos “ataques químicos” que são comprovadamente encenados por agências de inteligência de países ocidentais; e o Irão está ser agredido ao que parece pela sua alegada indústria nuclear com objectivos militares que a AIEA desmente em sucessivos relatórios trimetrais das inspecções a que as instalações iranianas são submetidas.

Israel, porém, é o único país nuclear no Médio Oriente; não o admite, esconde-o, a realidade é mais ou menos um segredo de Polichinelo e, no entanto, nem a ONU manda investigar nem a AIEA inspeciona o que quer que seja.

O SIPRI descreve da seguinte maneira o arsenal nuclear de Israel: 30 bombas gravitacionais que podem lançar armas nucleares por aviões de caça; mais 50 ogivas que podem ser lançadas por mísseis balísticos em terra; e um número desconhecido de mísseis de cruzeiro equipados com armas nucleares para lançar a partir do mar, o que garante a Israel uma base marítima com capacidade ofensiva de segunda vaga.

“Ambiguidade nuclear”

A instituição de investigação com base na Suécia dedica-se a estudar conflitos, comércio de armas e proliferação nuclear. Publica relatórios anuais pormenorizados sobre o comércio mundial de armamento e edita relatórios pontuais, como este dedicado às capacidades nucleares de Israel.

As estimativas apresentadas no relatório do SIPRI revelam que Israel possui entre 80 e 90 armas nucleares, um aumento em relação aos anos mais recentes. O instituto, porém, não conseguiu confirmar estes cálculos junto do governo de Israel, que se recusa sistematicamente a fazer comentários sobre o seu programa nuclear, uma política descrita como “ambiguidade nuclear”.

Como resultado desta “ambiguidade nuclear”, o número real de armas deste tipo é desconhecido. Algumas outras organizações, como a Nuclear Threat Iniciative, com sede nos Estados Unidos, calculam que Israel produziu plutónio em quantidades suficientes para cem a duzentas ogivas nucleares. Israel é uma das cinco nações no mundo que se recusam a assinar o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, uma iniciativa cujo objectivo é o desarmamento nuclear global.

Durante um discurso proferido no ano passado junto ao reactor nuclear de Dimona, no deserto do Neguev, o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, ameaçou recorrer a armas nucleares para “destruir” os inimigos de Israel. Mais recentemente, Netanyahu e os seus aliados norte-americanos acusaram o Irão de tentar desenvolver armas nucleares, apesar de as respectivas agências de espionagem reconhecerem há muito que Teerão não tem qualquer programa desse tipo.

Fugas radioactivas em Dimona

O relatório do SIPRI trouxe mais uma vez à superfície a questão do programa nuclear de Israel, juntando novas informações sobre as instalações israelitas que lhe são dedicadas – O Centro de Investigação Nuclear Shimon Peres Neguev, que inclui o reactor de Dimona. Os novos dados levantam igualmente fortes suspeitas em torno da segurança das instalações.

Há pouco mais de uma semana, um tribunal israelita recebeu queixas sobre várias fugas de lixo radioactivo que teriam sido escondidas de alguns funcionários das instalações. Um desses funcionários, Faridi Taweel, está agora a processar a instituição depois de saber que tem cancro provocado provavelmente pela exposição a material radioactivo que foi libertado no local.

A divulgação da ocorrência de numerosas fugas nas instalações de Dimona é muito preocupante, sobretudo à luz de informações divulgadas por cientistas israelitas e segundo as quais foram detectadas 1537 deficiências no reactor. Israel recusou-se a considerar a possibilidade de substituir ou reparar o envelhecido núcleo das instalações.

E, contudo, o facto de existirem fugas e de as instalações estarem repletas de deficiências deveria ser uma questão da máxima importância para os israelitas, uma vez que o centro de Dimona fica menos de 50 quilómetros a sul da capital do país, Telavive. O maior perigo, contudo, é para a própria cidade de Dimona, que dista apenas 13 quilómetros do reactor altamente defeituoso.

Dimona, porém, é uma cidade maioritariamente habitada por cidadãos judeus oriundos do Norte de África. Essa minoria de “judeus negros”, como é conhecida, é rotineiramente discriminada pelo governo israelita; um exemplo dessa realidade é a recente revelação da existência de um programa secreto governamental para esterilização de imigrantes judeus africanos, se necessário à força.

Além da população dominante de judeus africanos, Dimona e o vizinho deserto do Neguev abrigam várias aldeias beduínas palestinianas, frequentemente rotuladas como “ilegais” por Israel e, em seguida, arrasadas.

A circunstância de não haver vontade política do governo israelita para limpar e evitar fugas radioactivas somada à discriminação manifestada em relação às populações em risco revelam mais um aspecto preocupante e negligenciado do programa nuclear secreto do governo de Israel. 

Norman Wycomb, Estocolmo; com Whitney Webb, MintPress News

O Lado Oculto