Another Day of Life (Um Outro Dia de Vida), filme baseado nas memórias do repórter polaco Ryszard Kapuscinski (1932-2007) sobre a guerra de Angola, foi considerado a melhor longa-metragem da edição paulista do festival Anima Mundi 2019. É uma obra de Raúl de La Fuente e Damian Nenow (Polónia, Espanha, Bélgica, Luxemburgo, Holanda, Alemanha e Hungria).

 

Guerrilheira Carlota, do MPLA, fotografada por Kapuscinski uma hora antes da batalha em que morreu

 

Another Day of Life (Um Outro Dia de Vida), filme baseado nas memórias do repórter polaco Ryszard Kapuscinski (1932-2007) sobre a guerra de Angola, foi considerado a melhor longa-metragem da edição paulista do festival Anima Mundi 2019. É uma obra de Raúl de La Fuente e Damian Nenow (Polónia, Espanha, Bélgica, Luxemburgo, Holanda, Alemanha e Hungria).

Kapuscinski é um expoente do chamado jornalismo literário e teve vários dos seus livros publicados no Brasil (como Guerra do Futebol, O Imperador, Ébano: A Minha Vida em África). A obra que inspirou o filme premiado ainda não foi editada em português.

Como repórter de guerra, Ryszard Kapuscinski cobriu conflitos em várias zonas conturbadas do mundo, designadamente a guerra de libertação em Angola e, posteriormente, o conflito interno imposto por grupos armados patrocinados pelos Estados Unidos e a África do Sul do apartheid.

O filme narra episódios em Angola a partir de 1975, quando os portugueses se retiraram do país na sequência do processo de descolonização desencadeado pela Revolução dos Cravos, em 25 de Abril de 1974. Luanda era uma cidade em guerra depois da proclamação da independência, em 11 de Novembro de 1975, mas Kapuscinsky deslocou-se para a frente sul, para Pereira d’Eça, região onde, segundo a sua intuição, se iriam travar batalhas decisivas, designadamente quando a invasão sul-africana pretendeu apoiar os grupos terroristas que a terminologia norte-americana viria a designar como “combatentes da liberdade”.

Foi uma viagem perigosa, quase suicida, com elevado risco de morte. Kapuscinski conheceu então vários combatentes, em especial a guerrilheira Carlota, do MPLA, que passou a admirar. Carlota viria a morrer em combate pouco depois.

                                                                                                Um fotograma do filme

Habilmente, o filme mistura a narrativa em animação e depoimentos ao vivo de pessoas que conviveram com Kapuscinski durante aqueles dias de violência e esperança na construção de um novo país. Relata momentos cruciais, como aquele em que, já sabendo que tropas cubanas viriam apoiar os guerrilheiros angolanos, o jornalista evitou transmitir a notícia para sua agência, temendo que fosse interceptada pela CIA, que apoiava os terroristas. Os jornalistas têm lado, e Kapuscinski tinha o seu.

Muito elaborado do ponto de vista formal, dinâmico e fluido, Um Outro Dia de Vida é um filme emocionante, adulto e sincero. O título quer dizer que, para quem está em zona de guerra, tudo o que pode desejar-se é mais um dia de vida – que pode vir a ser o último. A promessa que fazia aos guerrilheiros era de que não seriam esquecidos. Seriam imortalizados nas palavras que Kapuscinski escreveria sobre eles. Estas palavras agora estão traduzidas nas fortes imagens deste filme de animação.

Luís O. Nunes, São Paulo; com Desacato.info