Gaïd Salah, homem forte da Argélia, fecha a capital durante a manifestação desta sexta-feira. Já foram presos quatro dos mais importantes líderes das mobilizações, acusados de “atentado à moral do Exército”.
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Barreira policial no acesso a Argel. Foto do El Watan.
                            Barreira policial no acesso a Argel. Foto do El Watan.

 

O general Gaïd Salah, chefe do Estado Maior do Exército da Argélia e homem forte do poder, decretou o encerramento dos acessos à capital a cidadãos que se desloquem de outros distritos nesta sexta-feira. As sextas-feiras, nos países islâmicos, são dias de descanso e oração. Na Argélia são também, desde 22 de fevereiro, dias de manifestações pacíficas em todo este país de 40 milhões de habitantes. Desde o início das mobilizações, que receberam o nome de hirak (movimento), houve manifestações todas as sextas-feiras de milhões de pessoas e em praticamente todas as cidades do país.

 

Fazem da liberdade de deslocação um pretexto para justificar o seu perigoso comportamento

 

Agora, o general anunciou ter constatado que “certas partes”, com “intenções maldosas”, “fazem da liberdade de deslocação um pretexto para justificar o seu perigoso comportamento, que consiste em criar todos os fatores que perturbem a quietude dos cidadãos, drenando a cada semana cidadãos vindos de diferentes wilayas (distritos) do país para a capital, para amplificar os fluxos humanos, nas praças públicas, com slogans tendenciosos que nada têm de inocente”.

O general ameaçou com a apreensão dos veículos e a imposição de pesadas multas aos motoristas que forem apanhados a dirigir-se à capital.

 

Bensalah foi à televisão no domingo 15 para convocar as eleições presidenciais em dezembro                                      Argélia: presidenciais convocadas para 12 de dezembro

 

Vale dizer que as barreiras da polícia nos acessos a Argel já eram rotineiramente montadas nas sextas-feiras anteriores, provocando enormes engarrafamentos, que acabaram por ter um papel dissuasor aos cidadãos que queriam manifestar-se na capital. Desta forma, as últimas sextas-feiras têm tido pouca ou nenhuma presença de manifestantes de outras cidades, e não foi por isso que tiveram menos participação, muito pelo contrário.

Onda repressiva

A decisão do general corresponde a uma de abolição do direito de ir e vir no dia de folga dos cidadãos e assemelha-se a um recolher obrigatório. Ela ocorre no momento em que o combalido poder põe em marcha as eleições presidenciais convocadas para 12 de dezembro, ignorando a vontade expressa pelo povo nas ruas, e evidenciando que não olhará a meios para anular a força do hirak e impor um presidente que dê continuidade ao regime instaurado em 1962, após a independência, e um presidente que seja da confiança dos militares.

 

Fodil Boumala, um dos líderes das manifestações preso na quarta-feira.
Fodil Boumala, um dos líderes das manifestações preso na quarta-feira.

Outra faceta deste endurecimento é a detenção de alguns dos principais dirigentes das manifestações. Nesta quarta-feira à noite foi preso mais uma das figuras proeminentes do hirako ativista e jornalista Fodil Boumala(link is external). A prisão de Boumala foi muito semelhante à dos seus companheiros: dois polícias à paisana foram buscá-lo a casa, à noite, tendo-o levado sem dizer para onde, o que os advogados têm considerado um método de rapto.

Boumala é o quarto líder do hirak preso em pouco mais de uma semana. Ele foi juntar-se a Lakhdar Bouragaa, Karim Tabbou e Sami Belarbi, todos em prisão preventiva sob a inacreditável acusação de “atentado à moral do Exército”.

Esta “caça aos líderes” vem-se juntar às prisões em cada vez maior número durante as manifestações. Já há mais de 40 detidos em manifestações em prisão preventiva, sendo a quase totalidade em Argel. Nas outras cidades onde houve detenções, os ativistas acabaram por ser soltos.

Greve geral em Bejaia

Em Bejaia, cidade portuária e industrial do litoral mediterrânico, foi convocada uma greve geral de um dia para terça-feira 24 de setembro. A greve, que será acompanhada por uma grande manifestação, foi convocada por uma reunião de representantes dos movimentos sociais, democráticos e de partidos como a FFS, o PT e o PST.

Os objetivos anunciados desta jornada são: “Rejeitar a fantochada eleitoral de 12 de dezembro próximo”, “denunciar as restrições à liberdade de expressão” e “exigir a libertação sem condições dos presos políticos e de opinião e do movimento popular do 22 de fevereiro”.

Além da importância económica, Bejaia é também a capital da Cabília, região histórica situada no norte do país e a 150 quilómetros de Argel, a terra dos cabilas, etnia de origem berbere. Nos últimos dias, a região tem sido palco de manifestações diárias em diversos povoados, reivindicando a libertação dos presos de opinião.

Luís Leiria

esquerda.net