A CNN despediu um prestigiado comentador e colaborador por defender a existência de um Estado único e secular na Palestina, com direitos iguais para todos os grupos étnicos e crenças. O Professor Marc Lamont Hill defendera horas antes essa opção partindo do princípio de que a solução de dois Estados foi inviabilizada pela colonização israelita nos territórios palestinianos ocupados.

 

Professor Marc Lamont Hill – Martha Ladesic, Nova York

 

Muito seguida e considerada como exemplo de referência da qualidade informativa e da liberdade de expressão, a CNN despediu o académico depois de este ter feito uma intervenção perante a Comissão da ONU pelos Direitos Inalienáveis do Povo Palestiniano na qual qualificou como “falida” a “solução de dois Estados para o conflito israelo-palestiniano”.

O Estado único e secular defendido por Marc Lamont Hill deveria permitir direitos iguais a todas as pessoas, israelitas ou palestinianas, que vivam na Palestina histórica, do Jordão ao Mediterrâneo.

Esta posição do seu colaborador foi qualificada como anti-semita pela CNN, que a interpretou como um apelo “à destruição de Israel”.

“Apoio a liberdade para os palestinianos e direitos iguais para israelitas e palestinianos; por isso sou profundamente crítico da política e da prática de Israel, que veda, de maneira brutal, a autodeterminação do povo palestiniano”, defendeu-se o comentador numa série de mensagens publicadas no Twitter. “A minha referência ‘do Jordão ao Mar Mediterrâneo’”, acrescentou, “não foi um apelo à destruição de qualquer coisa ou de alguém, como ficará claro a qualquer pessoa que tome conhecimento da minha intervenção. Não apoio o anti-semitismo, não defendo a morte de judeus nem qualquer outra coisa do género que me foi atribuída, limitei-me a defender direitos e liberdades iguais para israelitas e palestinianos. Passei a minha vida a lutar contra essas coisas de que me acusam e não vai ser a deturpação do conteúdo da minha intervenção que irá alterar o meu comportamento”.

Apoio de um lado, surdez do outro

O Professor Marc Lamont Hill recebeu o apoio de jornalistas e de várias publicações dos Estados Unidos, que apelaram à CNN para que reveja a sua posição, a qual, segundo alegam, além de ser um atentado contra a liberdade de expressão contribui para silenciar vozes que denunciam a violação de direitos humanos básicos. Nada indica que os apelos contra a prática de censura pela estação de Atlanta sejam escutados.

A organização Jewish Voice for Peace (Voz Judaica pela Paz) condenou a atitude da CNN, pediu a anulação do despedimento e elogiou o Professor Hill por falar “poderosamente” em defesa dos direitos dos palestinianos.

Youssef Munayyer, director executivo da Campanha norte-americana pelos Direitos dos Palestinianos, escreveu uma coluna no jornal Huffington Post na qual expressou a opinião de que Marc Lamont Hill “foi alvo do que pode ser simplesmente descrito como uma campanha organizada para silenciar a sua atitude consistente, baseada em princípios contra o racismo e pelo tratamento igualitário de todas as pessoas, incluindo os palestinianos”.

“A CNN demitiu-o”, acrescenta Munayyer, “porque ele considera que os palestinianos também se encaixam numa visão em que todas as pessoas merecem direitos iguais; para a CNN, isso foi demais”.

Glenn Greenwald, da publicação The Intercept, qualificou como “vergonhoso e cobarde” o comportamento da CNN. O despedimento de Hill “é uma grande derrota do direito de defender a cidadania dos palestinianos, de criticar livremente o governo israelita, do jornalismo e da liberdade de expressão nos Estados Unidos da América”.

O afastamento do colaborador da CNN revela, segundo Greenwald, os limites à liberdade de expressão praticados pelos media corporativos, segundo os quais “é proibido reconhecer que a chamada solução de dois Estados é inviável porque os colonatos israelitas ilegais cresceram tão rapidamente e comeram uma tal quantidade de terras palestinianas que a ideia deixou, simplesmente, de poder ser aplicada”.

De tal modo que, segundo Glenn Greenwald, as soluções que restam são a de apartheid ou então um único Estado “em que israelitas e palestinianos compartilhem direitos políticos iguais e plenos. Como todas as pessoas moralmente decentes”, acrescentou, “o Professor Hill defende um único Estado em que tanto palestinianos como israelitas têm direitos políticos iguais”.

Foi essa opinião que a CNN calou ao despedir Marc Lamont Hill.

O Lado Oculto