Painel de experts lista 160 atores chave da guerra no Iêmen que poderiam sofrer acusações, adicionando pressão ao Reino Unido para encerrar as vendas de armas para os sauditas

 

(Mohammed Hamoud/Getty Images)Créditos da foto: (Mohammed Hamoud/Getty Images)

O relatório da ONU será, provavelmente, usado como evidência adicional para os que exigem que o governo britânico encerre as vendas de armas para a Arábia Saudita para uso no Iêmen.

“Esse relatório chocante deveria servir como um alerta ao governo do Reino Unido. Oferece toda a prova necessária da miséria e sofrimento que estão sendo infligidos no povo iemenita por meio de uma guerra parcialmente alimentada pela venda de armas do Reino Unido para a Arábia Saudita e outros membros da coalizão”, disse MuhsinSiddiquey, diretor da Oxfam do Iêmen.

O Tribunal de Apelações do Reino Unido, em 20 de junho, decidiu que a venda de armas para a Arábia Saudita continuou sem investigação adequada por parte do Reino Unido no que diz respeito ao risco dos crimes de guerra sendo cometidos pela coalizão liderada pelos sauditas e exigiu que o governo do Reino Unido trace o que tem feito para corrigir isso. O governo do Reino Unido fornecerá sua resposta, possivelmente, esse mês.

O governo britânico, para defender a venda de armas para a Arábia Saudita, é amplamente dependente de uma equipe organizada pela Arábia Saudita para revisar supostas violações da coalizão, mas sua credibilidade é repetidamente questionada pelo relatório da ONU.

O painel da ONU, que inclui o britânico Charles Garraway, descobriu que a equipe saudita falhou em responsabilizar os culpados por ataques que acarretaram mortes de civis, o que aumentou “as preocupações com relação à imparcialidade das investigações”.

Também descreveu a avaliação saudita do processo de definição de alvos como “particularmente preocupante, [já que] infere que um ataque à um alvo militar é legal, mesmo que ocorram mortes de civis, assim, ignorando o princípio da proporcionalidade”.

Ataques aéreos feitos pela coalizão militar liderada pelos sauditas no sudoeste do Iêmen atingiram um complexo prisional, matando muitas pessoas, de acordo com o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (ICRC).

Organizado pelo conselho de direitos humanos da ONU há dois anos, o painel parece determinado a introduzir responsabilidades individuais nas condutas de guerra.

Forças do governo iemenita, incluindo aquelas apoiadas pelos EAU, continuam a ameaçar, prender e marcar indivíduos que os questionem abertamente ou os critiquem, incluindo opositores políticos, jornalistas, defensores de direitos humanos e líderes religiosos, disse o relatório. Ao menos 13 jornalistas e trabalhadores da imprensa estão presos em Sana’a com acusações relacionadas ao seu trabalho.

O painel da ONU disse que recebeu alegações de que os Emirati e forças afiliadas torturaram, estupraram e mataram oponentes políticos suspeitos presos em instalações secretas nas prisõesBir Ahmed, al-Bureiga e outro locais não-oficiais de detenção. Descobriu que muitos presos foram torturados, sofrendo violência sexual, eletrocussão e longos períodos de confinamento solitário.

Também descobriu que os soldados Houthi utilizaram minas terrestresantipessoal e anti-veículos, em violação às leis humanitárias internacionais, explicitamente na maneira como as minas eram colocadas em locais frequentados por civis, com pouco ou nenhum alerta, o que qualificou seu uso como indiscriminado. O uso de minas antipessoais foi proibido pela convenção de banimento às minas antipessoais, e a sua aplicação foi reconhecida pelas autoridades.

O governo do Iêmen, da Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e do Egito não cooperaram com o grupo da ONU ou sequer apoiam seu trabalho, mas o painel disse que, mesmo assim, conduziu mais de 600 entrevistas.

A ONU documentou ao menos 7.292 civis mortos (incluindo ao menos 1.959 crianças e 880 mulheres) e 11.630 civis feridos (incluindo 2.575 crianças e 1.256 mulheres) no Iêmen como resultado direto do conflito armado entre março de 2015 e junho de 2019. É previsto que o número geral de mortes seja muito maior.

*Publicado originalmente no The Guardian | Tradução de Isabela Palhares para Carta Maior