Benjamin Netanyahu, acaba de assinar com o primeiro-ministro polaco um documento em que branqueia a “a nação polaca no seu conjunto” do genocídio de mais de dois milhões de pessoas judias durante a Segunda Guerra Mundial
Benjamin Netanyahu, acaba de assinar com o primeiro-ministro polaco um documento em que branqueia a “a nação polaca no seu conjunto” do genocídio de mais de dois milhões de pessoas judias durante a Segunda Guerra Mundial

Benjamin Netanyahu, este homem detestável que um dia se atreveu a acusar a esquerda israelita de ter esquecido o que era ser judeu, acaba de assinar com o primeiro-ministro polaco, Mateusz Morawiecki, um documento em que branqueia “a nação polaca no seu conjunto” do genocídio de mais de dois milhões de pessoas judias durante a Segunda Guerra Mundial. No documento oficial ditado pela direita ultraconservadora polaca, falsificaram-se factos históricos, seguindo um argumentário grosseiramente negacionista.

Quando se conhece a instrumentalização sistémica da luta contra o antissemitismo do primeiro-ministro israelita e dos seus órgãos de propaganda para calar a boca a quem se atrever – em particular se for de esquerda – a criticar a sua política, fica-se duplamente surpreendido com esta declaração. Para não dizer desanimado.

No entanto, faço parte da minoria de pessoas judias com mais de 60 anos que se negou sempre a acusar coletivamente o povo polaco pelo genocídio cometido no seu país, ao mesmo tempo que insisto no facto de que milhares de cidadãos e cidadãs polacas puseram em perigo – inclusive sacrificaram – a sua vida para proteger famílias judias. Como em todos os países ocupados pelos nazis, a Polónia contava com uma minoria de gente malvada e corrupta, uma pequena minoria de pessoas Justas – mais do que se pensa – e uma maioria que fechou os olhos e deixou fazer, esforçando-se por sobreviver nas duras condições da ocupação nazi.

O que não impede que a Polónia tenha sido o cemitério de mais de dois milhões de pessoas judias massacradas pelo nazismo, mas também por pessoas polacas nacionalistas ou simplesmente apodrecidas por séculos de antissemitismo católico. O facto de o nazismo desprezar as pessoas polacas, assim como o conjunto das pessoas eslavas, e que numerosas pessoas polacas tenham sido vítimas da ocupação nazi não apaga esta participação ativa de uma parte importante da sociedade polaca no genocídio dos judeus. O mesmo pode-se dizer, por outro lado, de Holanda, Bélgica e França, em proporções certamente não comparáveis.

Yad Vashem, o mais importante centro de arquivos e de investigação sobre o genocídio dos judeus, denunciou severamente a declaração Netanyahu-Morawiecki, bem como a nova lei memorial votada pela Dieta [Câmara baixa do Parlamento polaco] e aprovada também pelo primeiro-ministro israelita. Esta lei criminaliza qualquer pessoa (dedicada à investigação, à política ou uma cidadã comum) que implique a responsabilidade polaca no massacre das pessoas judias. Inclusive Naftali Bennett, o Ministro israelita da Educação e chefe do partido de extrema-direita ultranacionalista e religioso “O Lar Judeu”, criticou duramente a declaração, que qualifica de “vergonha saturada de mentiras” – “Como Ministro de Educação responsável por promover a história do Holocausto, rejeito-a de A a Z”, declarou.

O vice-ministro polaco dos Negócios Estrangeiros reagiu com cinismo -“o que conta é a assinatura de Netanyahu, não a declaração de Yadd Vashem”- que expõe a extensão da ignomínia em que o primeiro-ministro israelita se afundou deliberadamente.

Esta decisão abjeta remete para a estratégia, e não para o oportunismo diplomático, como tinha ocorrido nas relações entre Israel e a África do Sul ou nas ditaduras militares na América Latina: o que une Netanyahu a Morawiecki, Orbán [primeiro-ministro húngaro] e outros líderes da extrema direita da Europa central e oriental, são valores comuns e a vontade de criar uma frente europeia capaz de contrabalançar os chamados Estados liberais que eles desprezam. Estes valores são o ultranacionalismo, o racismo, a xenofobia e em particular o ódio às pessoas migrantes.

Último exemplo desta comunidade de pontos de vista: a retirada forçada pelo Governo polaco da presidente do Supremo Tribunal e o seu controlo sobre a nomeação dos e das juízes. São exatamente os mesmos planos de Netanyahu em relação ao Supremo Tribunal israelita, já empreendidos pelo Ministro de Justiça Ayelet Shaked, que não oculta que a seus olhos, e aos do seu patrão, a independência judicial é um obstáculo à sua conceção populista da democracia.

Artigo de Michel Warschawski, publicado em Union Française Juive pour la Paix(link is external), tradução para espanhol de Faustino Eguberri para Viento Sur e para português de Carlos Santos, para esquerda.net