Vídeos flagram momento em que policiais sufocam homem com gás lacrimogênio no porta-malas.

 

 

 

 Jeferson Miola

Um homem morreu no começo da tarde desta quarta-feira (25) após uma abordagem violenta de policiais rodoviários federais, no município de Umbaúba, no sul de Sergipe. Vídeos de moradores flagraram o momento em que policiais prenderam a vítima no porta-malas do carro e populares alertavam que ele poderia morrer sufocado com o gás lacrimogênio.

Identificado como Genivaldo de Jesus Santos, de 38 anos, o homem tinha esquizofrenia. Um sobrinho afirmou que ele foi abordado pelos policiais enquanto pilotava uma motocicleta. Sua morte foi confirmada pela gerente do hospital do município, Cecília Bruneli, segundo o G1.

“Eu estava próximo e vi tudo. Informei aos agentes que o meu tio tinha transtorno mental. Eles pediram para que ele levantasse as mãos e encontraram no bolso dele cartelas de medicamentos”, disse Wallyson de Jesus ao G1. “Meu tio ficou nervoso e perguntou o que tinha feito. Eu pedi que ele se acalmasse e que me ouvisse”.

Ainda assim, os policiais fizeram o uso de spray de pimenta e o colocaram dentro do porta malas da viatura. “Eles jogaram um tipo de gás dentro da mala, foram para delegacia, mas meu tio estava desacordado. Diante disso, os policiais levaram ele para o hospital, mas já era tarde”.

Genivaldo era casado há 17 anos e tinha um filho de 7, conforme contou a esposa Fabiana ao jornal A8SE. Segundo ela, ele estava afastado do trabalho e o diagnóstico da doença foi obtido há cerca de 20 anos. Ela afirma que os policiais não detalharam por que teriam prendido o marido. A família registrou um Boletim de Ocorrência na delegacia da cidade.

A Polícia Civil afirmou que registrou o caso e fez coleta de alguns depoimentos, que já foram prestados por familiares e testemunhas na delegacia da cidade.

Em nota, a Polícia Rodoviária Federal informou que o homem “resistiu ativamente a abordagem de uma equipe PRF” durante uma ação policial realizada na BR-101. Eles argumentam que a vítima estava agressiva e por isso foram empregadas técnicas de imobilização e “instrumentos de menor potencial ofensivo para sua contenção”.

Eles afirmam que o homem teria passado mal quando foi conduzido à Delegacia de Polícia Civil. A equipe registrou a ocorrência na Polícia Judiciária, que irá apurar o caso.

 

Antes das câmaras de gás, nazistas matavam em caminhões de gás

 

Caminhões de gás usados por nazistas

 

Ao comentar a respeito do assassinato por asfixia de Genivaldo de Jesus Santos cometido por agentes da Polícia Rodoviária Federal [PRF], o historiador e professor da UFRJ Francisco Carlos Teixeira da Silva recorda que antes da adoção das câmaras de gás na Alemanha dos anos 1930, os nazistas eliminavam pessoas em caminhões de gás.

“Os caminhões de gás nazistas antecederam as câmaras de gás [imagem a seguir]… Agora redescobertas pela polícia brasileira!”, comenta, com escandalizado espanto, o professor da UFRJ.

Na opinião dele, “os últimos eventos policiais no Rio de Janeiro e em Sergipe, na esteira de tantos outros, mostram que as polícias brasileiras se fascistizaram de vez. Estão dispostas e agem como tropas SS”.

“Não podemos esperar limites”, diz Francisco, alertando ainda que “no processo eleitoral [as forças policiais] estarão disponíveis para todas as provocações e crimes contra a democracia”.

 

 

Para ele, “o passado não é a fonte de inspiração. Nem 1954, nem 1961, nem 1964. Temos que ter mente as novas formas de golpes e ameaças contra a democracia, como se deu na Bolívia em 2019, com brutal violência”. No golpe perpetrado contra o governo Evo Morales, as polícias exerceram papel decisivo na conspiração e com notável violência, abrindo o caminho para as Forças Armadas consumarem o golpe.

O professor alerta que “as tropas de choque do bolso-fascismo são as forças policiais” e, na provável hipótese de tumulto e caos gerado deliberadamente pelos bolsonaristas e milícias, “as Forças Armadas chegarão ao final como ‘pacificadoras’”.

É fundamental, por isso, “manter as forças populares em alerta e chamar a população para a ampla mobilização”, pontua o historiador.

Desacato

Aqui estão os nomes dos agentes da PRF que admitem ter detido Genivaldo, asfixiado em viatura

Clenilson, Paulo, Adeilton, William e Kleber assinam o boletim de ocorrência em que a morte de Genivaldo de Jesus Santos é tratada como ‘fatalidade desvinculada da ação policial’.

Os cinco agentes que registraram boletim de ocorrência policial pela detenção que resultou na morte de Genivaldo de Jesus Santos numa viatura da Polícia Rodoviária Federal são Clenilson José dos Santos, Paulo Rodolpho Lima Nascimento, Adeilton dos Santos Nunes, William de Barros Noia e Kleber Nascimento Freitas.

Todos são agentes do Comando de Operações Especiais da Polícia Rodoviária Federal no Sergipe e assumem, em documento oficial, compor a “equipe de motopoliciamento tático [que] efetuava policiamento e fiscalização” responsável pela detenção que terminou com a morte de Genivaldo. O caso ocorreu às margens da BR-101 em Umbaúba, Sergipe.

Como todo o Brasil pôde ver, três agentes colocaram Genivaldo na cela localizada na traseira de uma viatura da PRF, e um deles parece atirar uma bomba de gás no compartimento, o que faz surgir uma nuvem de fumaça. Em seguida, seguraram a porta quase que inteiramente fechada para que a vítima – e o gás – permanecesse dentro do veículo. É possível ver as pernas de Genivaldo para fora, se debatendo, e ouvir seus gritos de desespero.

Os agentes confessam no boletim que usaram “espargidor de pimenta e gás lacrimogêneo”, em função da “agitação do abordado”. Eram “tecnologias de menor potencial ofensivo”, garantiram.

Genivaldo, que sofria de esquizofrenia, foi levado a um hospital, mas morreu em seguida. O laudo do Instituto Médico Legal do Sergipe diz que a causa da morte foi insuficiência respiratória aguda secundária à asfixia. O crime ocorreu ontem, 25 de maio, num trecho da BR-101 que corta Umbaúba, uma cidade no litoral sul sergipano localizada a 109 quilômetros da capital Aracaju.

O boletim de ocorrência registrado pelos policiais, de número 1510422220525111006, parece tratar de uma ocorrência diferente da registrada em vídeo – ainda que não seja o caso. O documento fala em emprego do uso “diferenciado da força”, que ao ver deles ocasionou uma “fatalidade desvinculada da ação policial legítima”. No documento, os policiais fizeram questão de registrar os “delitos” de “desobediência” e “resistência”.

The Intercept Brasil