Juan Branco é provavelmente o mais brilhante jovem intelectual francês – herdeiro de uma fina tradição que vem de Sartre/Foucault/Deleuze. O establishment francês detesta-o, especialmente por causa do seu best-seller Crépuscule , onde disseca o macronismo – estigmatizado como um regime gangster – a partir de dentro e o presidente francês como uma criatura e instrumento de uma minúscula oligarquia.

Ele acaba de publicar Assange: L’Antisouverain (Les Editions du Cerf), um estudo absorvente e erudito que define como “um livro de filosofia acerca da figura do Anti-Soberano”. O Soberano é naturalmente o aparelho de estado.

Aqui (em francês) está uma excelente entrevista com Branco acerca do livro. Não há nada que seja remotamente comparável com isto na anglo-esfera, a qual tem tratado Assange essencialmente como um esquisito desagradável que ressuma difamação vulgar e acumula tiradas sub-ideológicas disfarçadas como factos.

O livro foi estruturado como um seminário para a super-selectiva Ecole Normale Superieure, a augusta escola no Quartier Latin que modela as elites francesas, um ninho privilegiado de instituições do poder e de reprodução de privilégios. Branco leva o leitor ao âmago deste universo só para fazê-lo descobrir Assange do ponto de vista de um daqueles estudantes.

Branco teve o privilégio de aproveitar a interacção entre a Ecole Normale Superieure e Yale. Ele encontrou Assange na embaixada equatoriana, em Janeiro de 2014, “num estado de confinamento radical” e a seguir acompanhou-o como consultor jurídico, advogado, “dia após dia”, até reunir-se outra vez com ele e Setembro de 2016, “a preparar-se para nada menos do que mudar o curso da eleição presidencial americana e engendrar a queda daquela que havia jurado esmagá-lo, Hillary Rodham Clinton”.

Branco está fascinado pelo “jornalismo científico” de Assange e pela sua capacidade de “intervir no espaço político sem ocupar um lugar específico”. Assim, Assange é retratado como um oráculo contemporâneo, um maníaco pelo acesso livre à informação, alguém que “nunca procurou uma recompensa ou inserção, ou protecção judicial”, o que é um modus operandi totalmente diferente de qualquer media.

Branco mostra como a WikiLeaks “permitiu a actuação de denunciantes”, com o crescimento de um arquivo paralelo à “produção de dados relacionados ao mecanismo dos aparelhos de poder contemporâneos”. Sob este sistema, “todo cidadão é capaz de se tornar um investigador”.

Assim, o trabalho de Assange tem sido acerca da redistribuição de poder. É como se Assange se tivesse tornado “um espião a serviço do povo”. E isso leva Branco a traçar a conexão com os Coletes Amarelos. Quando a WikiLeaks divulgou as “Macron Leaks” , em 2017, legitimou a luta dos Coletes Amarelos pela democracia directa.

Branco descreve Assange como “uma figura estranha, uma ponte entre a pré-história da civilização digital e a sua penetração definitiva como um elemento primordial, estrutural, do espaço político e social”.

Mas provavelmente a sua melhor avaliação de Assange é como “um dissidente do seu próprio espaço interno, interessado sobretudo na esfera da dominação cultural, económica e social na qual nasceu, a do imperium americano, do qual sua Austrália nativa é um dos aliados mais dedicados, e que domina este ciberespaço onde ele se constituiu como um actor político”.

No que poderia ser interpretado como razão principal para a ilimitada sede de vingança do governo dos Estados Unidos contra Assange está o facto de ele ter denunciado que “os actos americanos têm uma função regulatória natural para o resto do mundo, uma resultante da sua super-dominação do espaço geopolítico contemporâneo”.