A sobrevivência dos povos indígenas do Brasil está ameaçada devido à ausência de proteção contra o surto de Covid-19. Sebastião e Lélia Salgado organizaram uma carta aberta a Bolsonaro exigindo uma ação imediata das autoridades brasileiras para evitar “um genocídio”.
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                                                                                        Foto de Mídia Ninja/Flickr

 

Os povos indígenas do Brasil estão a ser dizimados há cinco séculos em consequência das doenças trazidas pelos colonizadores, às quais se juntaram o desmatamento, os incêndios florestais, rios e terras envenenados e a invasão das terras. Agora, a ausência de medidas para os proteger da Covid-19 deixa-os, nas palavras de Sebastião Salgado, “à beira de um genocídio”.

Ao apelo lançado por Sebastião Salgado e Lélia Wanick Salgado, já se juntaram nomes como Mario Vargas Llosa, Brad Pitt, Oprah Winfrey, Meryl Streep, Ai Weiwei, Norman Foster, Paul McCartney, Madonna, Gisela Bündchen, Naomi Campbell entre outros actores, músicos, escritores, cientistas e intelectuais.

“Hoje, com esse novo flagelo se disseminando rapidamente por todo o Brasil, comunidades nativas, algumas vivendo de forma isolada na Bacia Amazônica, poderão ser completamente eliminadas, desprovidas de qualquer defesa contra o coronavírus. Sua situação é duplamente crítica, porque os territórios reconhecidos para uso exclusivo de populações autóctones estão sendo ilegalmente invadidos por garimpeiros, madeireiros e grileiros. Essas operações ilícitas se aceleraram nas últimas semanas, porque as autoridades brasileiras responsáveis pelo resguardo dessas áreas foram imobilizadas pela pandemia. Sem nenhuma proteção contra esse vírus altamente contagioso, os índios sofrem um risco real de genocídio, por meio de contaminações provocadas por invasores ilegais em suas terras.” – podemos ler no texto da petição, que já recolheu perto de 200.000 assinaturas.

Em Novembro de 2019, vários representantes dos povos indígenas estiveram em vários países para denunciar como a política de Bolsonaro estava a pôr em causa as suas vidas, pedindo apoio internacional para que não fosse derramada nem mais uma gota de sangue indígena.

Em declarações ao The Guardian, Sebastião Salgado explica que “as comunidades indígenas nunca estiveram tão sob ataque. O Governo não tem qualquer tipo de respeito pelos territórios indígenas”, numa referência à política de Bolsonaro, incluíndo os severos cortes orçamentais das agências que trabalham para protecção dos povos indígenas e dos seus direitos, e à demissão de vários funcionários superiores, da área ambiental.

O fotógrafo invoca mesmo o exemplo do genocídio do Ruanda em 1994, por si documentado, lembrando que “no Ruanda vimos um violento genocídio, um ataque, onde as pessoas foram fisicamente mortas. O que acontecerá no Brasil também implicará a morte dos indígenas. Quando se aprova ou encoraja um acto que se sabe que vai eliminar a população ou parte da população, isto é a definição de genocídio… [será] genocídio porque sabemos que vai acontecer, estamos a facilitar… a entrada do coronavirus… [e desse modo] a dar permissão para a morte destes povos indígenas.” E conclui: “Seria a extinção dos povos indígenas do Brasil”.

De acordo com Sebastião Salgado, Bolsonaro não atuará por sua própria vontade, mas poderá fazê-lo sob forte pressão internacional, à semelhança do que aconteceu no ano passado com os incêndios na Amazónia.

“Só na Amazónia, existem 103 grupos indígenas com os quais nunca contactámos. Representam a Pré-História da humanidade. Não podemos permitir que tudo isto desapareça”, conclui Sebastião Salgado.

O Brasil tem actualmente 102.719 casos confirmados de Covid-19 e registou já 7.106 mortes. Das 20 cidades mais afectadas, com maior mortalidade e incidência de casos, 18 são no Norte e Nordeste do país, sendo a cidade de Manaus a mais afectada em todo o Brasil.

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